sábado, 9 de abril de 2011

FALTA ESTRUTURA Conselhos Tutelares não atendem denúncias

Formulários de notificação não são impressos e a quilometragem dos veículos é controlada

Os Conselhos Tutelares são uma das principais portas de entrada das denúncias de abuso sexual contra crianças e adolescentes. No entanto, com a justificativa de sofrer com a falta de estrutura, denúncias estão sendo deixadas de lado e empilhadas na mesa dos conselheiros.

O trabalho é feito a passos lentos e casos como abandono de incapaz, um das ocorrências mais comuns e graves pois acarretam perigo para crianças e jovens, estão sendo "empurradas com a barriga". Somente no Conselho Tutelar VI, que abrange os bairros da Secretaria Regional VI, são denunciados 30 casos desse tipo por mês. Do total, apenas dez são investigadas e acompanhadas.

O Ministério Público Estadual não está alheio à questão. Desde 2009 abriu pelo menos 11 procedimentos investigando negligência, omissão, falhas no atendimento e desvios de conduta por parte de conselheiros tutelares em Fortaleza. São casos de suspeita ou confirmação de maus-tratos ou outras violações a crianças e adolescentes que deixaram de ser atendidos ou quando ocorre, a morosidade compromete a defesa do criança e adolescente em risco.

Um exemplo é a história envolvendo a dona-de-casa C.R., moradora do bairro Cajazeiras. Alcoólatra e mãe de cinco filhos, ela foi denunciada pelo menos quatro vezes por se embriagar, arrumar confusão e deixar as crianças sozinhas. Somente com a ida da reportagem até a sede do Conselho, no Dias Macedo, é que a visita foi feita.

No entanto, foi preciso esperar mais de uma hora e meia até o carro da entidade chegasse para o conselheiro Marcos Paulo Vasconcelos seguir até o local. Segundo ele, o veículo é terceirizado em razão de a Kombi oficial estar quebrada desde o ano de 2009.

Flagrante

A demora deu tempo para a mulher. Em sua casa não houve flagrante, mas os vizinhos confirmaram as denuncias. "Não quero dizer meu nome, até porque ela bebe, xinga e não quero confusão, mas tudo isso que dizem dela é verdade", afirma uma vizinha.

Na moradia da denunciada - um espaço de dois vãos - moram a dona-de-casa e os filhos de 15 anos, sete, cinco e o tio dos meninos, que é desempregado e também alcoólatra. Logo na porta, se sente o mau-cheiro exalado pela sujeira e fezes do cachorro criado por eles. Os outros dois filhos moram com o pai.

A mulher nega o abandono, confessa que bebe, mas deixou a bebida há 15 dias, quando retornou à igreja. "Nunca deixaria meus filhos. É tudo mentira", garante.

O conselheiro pede o registro da criançada e indaga onde o rapaz dorme. "Ele fica na rede, não chega perto das meninas", responde de pronto a mãe. Curiosos, os vizinhos acompanham a visita da porta.

Um deles, sem dizer o nome, informa que numa dessas brigas envolvendo bebedeira, a menina mais nova, passou mal. "Ela tem problemas no coração", contou a vizinha ao conselheiro.

A Secretaria de Direitos Humanos (SDH), que coordenada os Conselhos Tutelares de Fortaleza, informa que vêm sendo realizadas reformas estruturais nas suas sedes.

De acordo com a assessoria de imprensa do órgão, a construção do prédio do Conselho Tutelar II está em andamento e que o Conselho Tutelar V já ganhou nova sede. A assessoria garante ainda que as benfeitorias no Conselhos não param por ai. Informa que novas licitações serão feitas para a aquisição de veículos que atenderão aos conselheiros e permitirão atendimento mais rápido.

Onde denunciar

Conselho Tutelar I Rua Antônio Bandeira, 89, Jacarecanga - 0800 85 8069 / 3281 2086 / 3281 4096

Conselho Tutelar II - Rua Tereza Cristina, 112, Centro - 3452 3462 / 3452 6933

Conselho Tutelar III Rua Silveira Filho, 935, João XXIII - 0800 280 2572

Conselho Tutelar IV Rua Peru, 1957, Vila Betânia - 0800 28 0014 / 3469 6662 / 3292 4379

Conselho Tutelar V Av. B, S/N - 1ª Etapa, Conjunto Ceará - 0800 85 5400 / 3452 2482 / 3452 2483

Conselho Tutelar VI Rua Pedro Dantas, 334, Dias Macedo - 3295 5781 / 3295 5784 / 3295 5794 / 3295 5709

Disque 100

0800.285.0880

Atendimento

Conselheiro garante que escolhe casos mais graves
De acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), cabe aos conselhos atender e aconselhar os pais ou o responsável, requisitar serviços públicos, como os de segurança, encaminhar ao Ministério Público denúncia de crime e até acionar a Justiça. Os conselheiros não negam tamanha responsabilidade e dizem ter o trabalho comprometido pela estrutura falha dos Conselhos.

“O problema não é de agora e confesso que a gente tem que escolher o caso mais urgente para ser apurado”, desabafa o conselheiro Marcos Paulo.

Além dos veículos com quilometragem controlada, ele informa que desde 2006 os formulários de notificação não são impressos. “A gente é que tira cópia na marra para continuar trabalhando nas mínimas condições”. denuncia Marcus Paulo Vasconcelos.

Os conselheiros reclamam que a demanda é grande para o número de Conselhos. Conforme a Resolução 75 do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), para cada 200 mil habitantes deveria existir um Conselho Tutelar. Isso significa que a Capital deveria ter 12 Conselhos Tutelares, pois, de acordo com estimativa do IBGE, Fortaleza tem uma população de 2.5 milhões de habitantes. Seria preciso o dobro do número de Conselhos Tutelares. “Nossa vida é muito complicada”, diz Vasconcelos.

Outra questão citada por ele é com relação ao horário de funcionamento. Segundo afirma, os conselhos também têm limitação no atendimento da população. Funcionam apenas durante o dia, sem plantões nas noites e finais de semana.

LÊDA GONÇALVES
REPÓRTER

Fonte: http://diariodonordeste.globo.com/materia.asp?codigo=962368

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